Segue a cena final de "Morte em Veneza", a mais feliz realização audiovisual deste planeta, com o famoso Adagietto de Mahler, a mais pungentemente bela música já ouvida (a beleza de Bach vai acima de pungências, que são sempre demasiado humanas).
Link no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=4FTp0qfpQww
Há um elemento trágico na minha juventude: temo esgotar a beleza ao conhecê-la, ao experimentá-la; evito o Adagietto de Mahler, pois duvido que possa existir algo mais belo, e me aflige a ideia de que experimentei, ainda tão jovem, o que há de mais sublime na existência; se o máximo prazer já foi desfrutado, o que restará daqui pra frente? Eu já temia desde muito pequeno: evitava brincar com meus brinquedos mais bonitos, tanto para preservá-los quanto para preservar a mim, evitando consumir-me na breve e intensa chama do prazer. A cada intenso prazer vai-se um pedaço da inocência, e quando não mais restar inocência, tampouco haverá prazer. Sim, Visconti é que sabe: ouvir o Adagietto é morrer no lugar mais belo do mundo.
“Sabedoria, verdade, dignidade humana, está tudo acabado” diz o personagem; digo eu que elas acabam depois de se ouvir o Adagietto, porque não é possível que tenhamos chegado a tal ponto de fruir a beleza sem que se tenha perdido algo irrecuperável, algo essencial. Mahler deve ter contas a acertar com Mefistófeles – e Visconti também; todos nós, pensando bem.
“Não há impureza mais impura que a velhice”. Está pronto para morrer aquele que não puder mais ser o semideus apontando para o infinito; o Aadagietto nos comunica este desamparo doce. Bem, a música e a cena verdadeiramente me arrepiam, então ainda tenho inocência suficiente.
Nos aguarda, em algum lugar, o penoso vislumbre do correr dos últimos grãos da ampulheta. Mas enquanto houver um grão, um único que seja, fremindo de força vital antes da queda, haverá o prazer e a beleza da vida.
Link para a 5ª Sinfonia de Mahler: http://pqpbach.opensadorselvagem.org/gustav-mahler-1860-1911-sinfonia-n%c2%ba-5/
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Veneza é Veneza. De tantos artistas que já a estudaram e nela se inspiraram, eu quero lembrar do londrino Joseph Turner (1775-1851).
“É em sua maturidade que Turner mais e mais se liberta da visão convencional das coisas. A experiência de Veneza, decisiva, permanece por anos a fio como o exemplo da sinfonia de tons e da aura poética que o pintor prossegue. A Baía de Rocky com Figuras já participa desse clima de sortilégio, como também Iates que se Aproximam da Costa, quadro pintado na Inglaterra mas reminiscente da lição veneziana, documentando sua fascinação pela atmosfera feiticeira da cidade italiana.” (Gênios da Pintura, nº 56, Abril Cultural, 1984)
"Chuva, vapor e velocidade"
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